20 de out. de 2009

Viagem


Inspirada numa vontade

Depois de muitos desencantos, o encontro deles havia sido encantador.
Rapidamente criaram laços.
Riam por qualquer coisa.
Conversavam por horas a fio.
Ele cantarolava.
Ela dançava mambo.
Pareciam duas crianças.
Eram duas crianças felizes.
Sem mais delongas, ela o convidou:
- Vamos fugir para Pasárgada!
- Pra onde?
- Para Pasárgada.
- Com você eu vou.
- Vamos já?
- Farei as malas. Quanto tempo em Pasárgada ficaremos?
- Que tal pelo tempo que durar? 
- Assim já cantava Marisa Monte.
- Paráfrase do Soneto da Fidelidade.
- Realmente, o poetinha já dizia isso.
- Tudo pronto para nossa partida?
- Quase tudo. Só uma pergunta: por que para Pasárgada?

Recitando Manoel Bandeira ela explicou:

Vou-me embora pra Pasárgada

Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada
Vou-me embora pra Pasárgada
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
e tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha
Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive

E como farei ginástica
Andarei de bicicleta
Montarei em burro brabo
Subirei no pau-de-sebo
Tomarei banhos de mar!

E quando estiver cansado
Deito na beira do rio
Mando chamar a mãe-d'água
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Rosa vinha me contar

Vou-me embora pra Pasárgada

Em Pasárgada tem tudo
É outra civilização
Tem um processo seguro
De impedir a concepção
Tem telefone automático
Tem alcalóide à vontade
Tem prostitutas bonitas
Para a gente namorar

E quando eu estiver mais triste

Mas triste de não ter jeito
Quando de noite me der
Vontade de me matar
— Lá sou amigo do rei —
Terei a mulher que eu quero
Na cama que escolherei
Vou-me embora pra Pasárgada.

Já faz tempo que foram para lá e, pelo que dizem, de lá não pretendem voltar.

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